WE LOVE KATAMARI
WHY WE LOVE KATAMARI



COREgaming - 02 / 11 / 07

 

Não é um jogo normal. O primeiro ecrã é o primeiro desafio: escolhe-se um jogo novo ou um jogo gravado a partir do logotipo da editora. O interface não responde aos botões habituais. Talvez haja algum problema com a ligação do comando. Mexe-se num dos analog sticks e... nada. É melhor consultar o manual. "Use ambos os sticks analógicos"; que noção curiosa!

Muito se falou acerca dos controlos do jogo. De facto, é difícil ficar indiferente à simplicidade e originalidade de um jogo que usa ambos os sticks do Analog 2 em toda a sua capacidade tridimensional. Os controlos digitais quase nem são usados, o que faz perguntar como é que este não se tornou o método de controlo padrão na PS2. Com dois polegares, evitamos o button mashing convencional dos jogos de atletismo, de que me lembro desde os velhos tempos do Spectrum.

O WE LOVE KATAMARI é o sucessor de KATAMARI DAMACY , um jogo de culto da autoria de Keita Takahashi, que colaborou, como programador, em dois jogos da série DYNASTY WARRIORS . É difícil para o autor dizer exactamente porque é que um jogo deste tipo alcançou um estatuto tão elevado junto dos fãs, porque o objectivo era apenas simplificar. Ora, a simplificação é, em si, algo muito diferente do habitual. No tempo em que se procura a simulação, a fusão naturalista entre o real e o virtual, o recurso a objectos poligonais e estilizados, pelo contrário, orienta o jogador para uma experiência radicalmente distinta.

A experiência lúdica regressa ao campo da imaginação colorida da Lego e da Playmobil (não por acaso, uma referência clara de Takahashi). Em contrapartida,  neste campo de referência, não estamos limitados a um cenário único -- é possível enquadrar referências das mais díspares proveniências, sem preocupações de unidade cultural ou estética. WE LOVE KATAMARI assume este ecletismo também na banda sonora, que possui uma certa perversidade kitsch de uma mistura de estilos consciente e deliberadamente anárquicos. O pior que posso dizer é que já dei por mim a jogar para ouvir Katamari on a Swing.

É um jogo colorido, de traços infantis e estética inspirada nos polígonos grosseiros dos anos 90. Pontuado por cutscenes relacionadas com uma storyline que continua a do jogo que o precedeu, WE LOVE KATAMARI é povoado por uma família real alargada, cheia de primos, tragédia e conflito. Ajudamos o príncipe herdeiro do Universo a assumir a posição de sucessor do seu pai. Este, por seu lado, é tão sensível à lisonja como rápido nas suas fúrias, não deixando de ter alguns paralelos com o Yahweh bíblico.

Um dos aspectos mais satisfatórios do jogo é a escala. É completamente expansível. No início do jogo, controlamos um pequeno katamari (bola adesiva), com o objectivo de alcançar uma dimensão substancial, começamos numa sala minúscula em que podemos tropeçar num clip e vamos “enrolando" objectos variados até alcançar tamanhos substanciais - e acrescentar transatlânticos e nuvens à colecção. Os desafios são variados: alcançar um tamanho definido no mais curto espaço de tempo, enrolar apenas um tipo de objectos, etc., mas o processo é sempre o mesmo. No início, ainda é possível crescer sem grandes critérios, mas também ser atropelado por um gato interessado numa bola minúscula...

Numa nota um pouco megalómana, eu diria que as coisas começam a ficar interessantes quando alcançamos escalas mais substanciais. Passamos a poder "limpar" as ruas da cidade de pessoas e automóveis. De um jogo concebido no Japão, imagino, dever-se-ia esperar esta cidade atarefada e completamente atafulhada de objectos.  É uma metáfora interessante para o crescimento numa sociedade consumista: a selectividade dos materiais que usamos para crescer acelera o aumento de escala e aproxima-nos de um objectivo definido. Tal como na vida, a melhor estratégia é ser muito selectivo com os materiais consumidos. Neste aspecto e na sua tendência marcadamente cosmopolita (embora com atmosfera claramente japonesa), Katamari é muito diferente de jogos em que o consumo é muito mais indiscriminado, como Pacman, fazendo uma ponte entre este e outro jogo fundamental, Tetris. Se a acumulação é importante, o método também o é.

É agradável a simplicidade desavergonhada de WE LOVE KATAMARI . É bom saber que, no meio da carnificina, crime e exploitation dos jogos mais vendidos, ainda existem pequenos oásis com espaço para divertimentos patetas e totais perdas de tempo - o que me parece ser o maior elogio possível a um jogo, nos tempos que correm. Isto porque, muitas vezes, se entrevê, em certo tipo de jogos, uma espécie de treino militar ou empresarial, para "funcionalizar" o jogador. Os simuladores de voo são programas tão disciplinadores como um processador de texto, isto é, tentam apelar a algumas competências úteis do jogador. O mesmo acontece com os shoot them ups online, um fenómeno que deve ser popular entre a base de recrutamento das forças armadas de todo o mundo.

Subversivo, WE LOVE KATAMARI inverte a ideia "Lego" da construção baseada em módulos (os objectos de Katamari são sempre poligonais e quase queremos encaixá-los uns nos outros) e mistura-a com a do hobby do coleccionista, quer esteja interessado em relíquias raras ou em objectos fabricados em massa. O resultado é uma pilhagem divertidíssima que nos faz oscilar entre o gozo de começar a "enrolar" seres humanos e a expectativa de poder fazer o mesmo ao Taj Mahal.

Depois, também temos a frustração de pegar em coisas que não queremos ou de transformar o katamari cilíndrico num objecto irregular e arestado que não rola para onde se deseja. Como no mundo do consumo, em que aquilo que adquirimos nos transforma e, se não temos cuidado, nos limita a um ponto insuspeito.

 

Lançado em 2006, We Love Katamari é o seguimento ao pequeno êxito do ano anterior, Katamari Damacy, que nunca chegou ao mercado europeu.

Apesar da curta carreira, Keita Takahasi, criador do jogo, ganhou grande distinção após uma boa recepção da crítica e de um pequeno movimento underground de fãs do jogo.

Segundo o criador, a série Katamari mistura as mais variadas influências, desde a pintura de Picasso e Juan Miró às soluções urbanísticas de alguns grandes arquitectos japoneses. Ainda que único, o jogo também se inspira de outras obras existentes no mundo dos videojogos, nomeadamente da estética de NO ONE CAN STOP MR. DOMINO da ArtDink ou no sentido de humor de INCREDIBLE CRISIS da Polygon Magic.

 

 

 

 

 
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