Hoje
associamos a génese dos videojogos à criação
tecnológica japonesa. Apesar de não ser verdade é
possível dizer que a existência de consolas e de um mercado
tão sólido à sua volta se deve quase inteiramente
à audácia de alguns criadores japoneses que recapturaram
o interesse do público mundial. No ano de 82 o mercado tornou-se
demasiado saturado e a reputação dos jogos de consola
sofreu danos irreversíveis. Companhias como a Nintendo foram
essenciais na forma como conseguiram impor um produto estrangeiro
num mercado altamente céptico e relutante, renovando-o e expandindo-o
até valores nunca antes imaginados.
POWER-UP
é um estudo sobre as origens dos jogos no Japão, como
estes começaram como uma importação de hardware
norte-americano e em poucos anos se tornaram uma indústria
de produção autónoma exemplar para o resto do
mundo. A nomes como Tomohiro Nishikado, Toru Iwatani, Gunpei Yokoi
e Shigeru Miyamoto devemos a configuração de tipos e
géneros vídeo-lúdicos actuais, os sustentáculos
de uma indústria que abrange todo o mundo e que cultiva lucros
na ordem das dezenas de biliões de dólares todos os anos.
O maior trunfo de Kohler é
o conhecimento da cultura e língua japonesa, aspecto que lhe
permite inferir algo mais de jogos que a maioria de nós, ocidentais,
já jogou. Todo o livro debate a problemática dos jogos
japoneses e a forma como estes se tornaram, eventualmente, os mais
importantes e rentáveis embaixadores da cultura japonesa.
Porém, a relação
de complexas influências é aqui estudada em ambos os
sentidos: observando a produção de jogos nipónica,
encontramos produtos fortemente influenciados pela cultura americana
e até europeia. A pergunta de fundo que se tenta responder
é o que é que caracteriza as criações
japonesas. Títulos como VIB RIBBON
e GUITAROO MAN são exemplos de
géneros vídeo-lúdicos flagrantemente originais
que espelham a forma dinâmica e arrojada como os criadores japoneses
encaram a sua actividade. Após 30 anos de êxitos, ainda
existe espaço para novos géneros e originais reinvenções
dos antigos.
A profundidade com que o autor
chega a analisar certos assuntos chega a ser exagerada: qual a real
necessidade de examinar os personagens principais de FINAL
FANTASY VI, um a um, num livro que se debruça sobre
um tema tão abrangente? Também o capítulo sobre
Akihabara em que somos bombardeados com descrições minuciosas
das lojas e de onde conseguir os melhores preços se torna redundante:
é obvio que Kohler quis demonstrar o conhecimento que adquiriu
enquanto viveu no Japão porém este género de
informações seriam mais apropriadas para um guia turístico
do que para um livro analítico e reflexivo.
O verdadeiro ponto alto desta
leitura encontra-se nos primeiros capítulos, indubitavelmente
os mais apelativos, mas perde-se, de certa forma, conforme descobrimos
que o tema proposto, tão bem apresentado, não foi devidamente
concluído. Aliás, é evidente a forma descuidada
como o autor, após uma prolongada fuga do tema central que
se estende ao longo de alguns capítulos, regressa quase no
final rematando o livro de uma forma apressada e inconclusiva. Todos
os grandes heróis do game design nipónico estão
presentes mas neste panteão não existe, incompreensivelmente,
lugar para nenhum nome associado à SEGA - característica
que parece ser comum na maioria dos livros sobre videojogos. É
inadmissível que um autor que pretenda dissecar quase três
décadas de produção vídeo-lúdica
japonesa omita o capítulo da criação da empresa
que liderou, invicta, o sector dos jogos coin-op e rivalizou durante
anos no comércio de consolas com o líder Nintendo.
Não obstante de alguns
dissentimentos, o livro continua a ser o único estudo em língua
inglesa que aborda, única e exclusivamente, a maravilha sagazmente
oculta por detrás dos mais emblemáticos títulos
oriundos do Japão. Vale, sobretudo, pela boa base de dados
que oferece e que reflecte um excelente trabalho de investigação
e preparação do texto. Uma verdadeira pena que o autor
não tenha tido a coragem de levar a cabo a tarefa a que se
propõe. Ficou pendente a formulação de uma hipótese
válida que explicasse, efectivamente, como os jogos japoneses
concederam ao mundo uma vida extra.